A morte é sobre saudade

Isabelly Emiliano
3 min readOct 25, 2018

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Tenho medo da morte.

A morte parece um vazio. É como se não existisse nada mais quando a pessoa morre. É como dormir e não acordar nunca mais. A morte faz com que um buraco seja aberto no peito de quem perde pai, mãe, irmão, parente ou amigo.

É difícil superar. A dor não é pelo substantivo “morte”, e sim pelo fato de nunca mais ver alguém tão importante.

No mundo inteiro, em média 151.600 pessoas morrem a cada dia, segundo o relatório do Ecology Global Network. Gente morre em acidente de trânsito, por homicídio, por suicídio, por causas de doenças como o câncer ou simplesmente por velhice.

Quem morre é importante. Importa porque é família de alguém por laço de sangue ou fraternal.

Ir a enterros é simples. O pior é quando você é a pessoa que enterra alguém. O anfitrião do enterro – ou deveria ser – já que muitas vezes, nessa situação, as pessoas entram em estado de choque tão grande que fazem uma cena digna de compaixão: “minha mãe, por favor, me deixem ficar com a minha mãe” e isso é repetido diversas vezes num volume muito alto. Outros casos podem simplesmente, desmaiar ou sofrer um ataque de pânico.

Quando a “senhora” morte impacta outra pessoa, está tudo certo. Mas, quando vem me impactar, não dá para aguentar.

Passei toda a vida sem pensar na morte. Até que li, pela segunda vez, A Menina que Roubava Livros, de Markus Zuzak. E quando a morte conta uma história é preciso prestar atenção e ler. A guerra levou pessoas importantes para Liesel, personagem principal da trama. Embora, fosse um livro que representasse um acontecimento verdadeiro, não impactava diretamente a minha vida.

Porque a morte impacta?

O livro deixou uma pergunta no meu interior: “por que a morte impacta?”. Ainda hoje essa pergunta foi meio respondida com o fato de sermos humanos, temos emoções e é normal sentir saudade.

Passaram-se anos.

Então, entrou em cena uma doença perigosa, conhecida por grande parte da população mundial, o câncer. É definida pela divisão incontrolável de células anormais que destroem o tecido do corpo. 12,7 milhões de pessoas são diagnosticadas todos os anos, mas nem todas encontram a cura. 7,6 milhões de pessoas morrem todos os anos, segundo a Declaração Mundial Contra o Câncer.

Uma mulher de 75 anos foi diagnosticada com câncer de útero nível dois, começou logo o tratamento. Quimioterapia e radioterapia. Um ano depois não resistiu e morreu.

O problema é que, quem olha de dentro, fica aterrorizada com a possibilidade de o câncer matar. O medo é grande. O que acontece depois? O medo de acordar e mais uma vez perceber que o quarto ao lado é de outra pessoa é vivido diariamente. Porque essa mulher idosa era minha avó.

O presente é uma incógnita que pode mudar o número da equação da vida. Num momento a programação pode ser ir à praia, no outro pode ser ir ao hospital.

A outra vez que pensei na morte devo atribuir como consequência de ter lido um bom livro do jornalismo brasileiro, escrito pela Daniela Arbex: Todo Dia a Mesma Noite- A História Não Contada da Boate Kiss. Um relato muito bem detalhado de famílias que perderam seus parentes e estavam lidando com a dor de uma forma única, às vezes imaginando que seus filhos, irmãos, amigos só foram viajar e ainda não chegaram.

Sim, eles viajaram. Para um mundo escuro que não tem mais volta.

Pensei na morte porque o meu irmão (e melhor amigo), assim como muitas pessoas que estavam na Kiss em janeiro de 2013, saiu da casa dos nossos pais para estudar em outro estado. Saiu de Pernambuco para fazer Ciência da Computação na Universidade Federa da Paraíba (UFPB). Lá na cidadezinha de Rio Tinto, onde mora, tem um evento que acontece todas as quintas-feiras, chamado “Quinta Universitária”, uma espécie de calourada que se repete toda semana.

O medo era acontecer algo de ruim em alguma dessas “Quintas” e nunca mais poder falar com ele.

Todos os dias algumas pessoas morrem e outras pessoas estão acordando pela primeira vez.

Como diz uma música de banda Teatro Mágico:

Percebi que a cada minuto. Tem um olho chorando de alegria e outro chorando de luto

E, hoje, choro por ver as maravilhas feitas por Deus, mas amanhã? Não é possível saber.

Já disse o grande poeta Vinícius de Moraes:

quem sabe a morte, angústia de quem vive

Só quem permanece vivo sabe qual o tamanho da saudade e a intensidade que é a dor de perder alguém.

Não é sobre a morte. É sobre Saudade.

Pensar sobre morte. O vazio. O buraco no peito.

Um último adeus que nunca foi dito.

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Isabelly Emiliano
Isabelly Emiliano

Written by Isabelly Emiliano

Escritora muito antes de ser jornalista. Acabei de escrever um livro que precisa ser publicado. Enquanto o dia não chega, você pode ler alguns textos aqui.

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