O doce toque de chocolate
O chocolate quase parece ter boca e braços, o primeiro para dizer palavras galantes e românticas, enquanto o segundo conforta e segura. Há quem conheça todos os ingredientes, prefira os mais saudáveis ou amargo, e existem também aquelas pessoas que não ligam, só lêem o rótulo “ao leite”, “meio amargo” ou “amargo” e só enfiam na boca, deixando cada área da língua saborear o que tem de melhor. Se está chateado, um chocolatinho pode resolver. Feliz, o dia merece um milkshake, sabe de qual gosto? Chocolate.
Esse doce é regulador emocional, hormonal para quem está de “TPM”, o “tchan” na dieta e, possivelmente, uma conexão entre pessoas. Existe alguém que não gosta de chocolate? Se existe, com toda certeza, o “ser de outro mundo” poderia contar sua história traumática com a maior atenção lhe direcionada.
Como a guloseima mais eficiente de toda terra seria odiada e desprezada?
Açúcar, massa de cacau, manteiga de cacau, são os ingredientes principais, só conseguem ser bons juntos. Tente experimentar cacau puro ou uma colher de açúcar cristal, das duas uma; engolir com careta ou cuspir. Eu, pelo menos, já experimentei as duas opções. Meu pai tinha o costume de trazer cacau da casa de parentes, abria a casca amarela e me dava um pedaço da polpa, macia e quase sem gosto. Já o pó, o que a gente pode ir na feira dizer:
“moça, me dá um quilo de cacau em pó”
É amargo, tanto que depois dos 2,5l de água recomendado para a hidratação diária, é impossível tirar o gosto da língua. Parece loucura, no entanto aquela barrinha com tantos quadradinhos escuros é tão gostosa.
Lembro bem quando precisei parar de comê-lo. Ninguém sabia o problema, podia ser a matéria prima, lactose ou glúten. Não tive tempo de sentir minha língua estremecer de prazer uma última vez. O gosto não ficou perdido no céu da boca, nem na garganta ou passeou pelos dentes com a água. Naquele momento, em que achei que seria nunca mais, as pontas dos dedos iam para o pescoço, a garganta arranhava, a voz falhando, a gengiva doía e o olhos inchavam.
Será que eu poderia viver sem… Chocolate?
Passaram-se anos, via amigos a comer brigadeiro, entrar com várias barras escondidas na sala de cinema. Eu fingia, muito mal, que conseguia superar, poderia então, viver sem o doce. Embora, assim que vislumbrava, era um cachorro pidão, os olhos brilhando e a boca salivando. Engolia em seco, tomava um gole d’água e virava o rosto. Disfarçava.
Anos depois, centenas de anti-alérgicos, dezenas de laudos, o cacau foi condenado precocemente. Julgado por sua excessiva quantidade de açúcar, toque suave e sabor incomparável, foi preso por um crime que nunca cometeu. A urticária, tontura, coceira, enjoo, inchaço e dificuldade de respiração, não foram delitos seus.
Julgamos que tinha ele cometido um crime, que se investigado com afinco, descobriríamos a injustiça, sentenciado antes da audiência. Encontramos o culpado, o chocolate foi liberado.
Sabia que o que mais queria era vê-lo, tocá-lo, senti-lo, saboreá-lo. E o fiz. Exatamente como se nunca tivesse feito antes ou como se não tivesse o posto atrás das grades. Fui recebida semelhante a uma velha amiga, amparada, amada, e cuidada.
Lembro bem daquela primeira vez após tanto tempo.
Senti os pelos da nuca eriçarem com o toque suave e aromatizado daquele pedaço de 25 gramas. O prazer atravessava todo o meu corpo, da ponta dos dedos dos pés até a última raiz de cabelo. Os olhos reviraram, assim como a língua descansava e os dentes pressionavam o lábio inferior. O gosto era diferente a todo o resto, o sabor, a textura, a embalagem, tudo parecia casar e me chamar para aquela experiência.
Provei e quis mais.
Ainda espero ser tocada como o chocolate me tocou e ter a mesma memória afetiva da primeira vez. O toque, o abraço, o gosto, o beijo.
Se você, assim como eu gosta de chocolate e um bom texto, bata palminhas.
Eu não tenho mais textos sobre comida, então vou deixar dois textos de quando me apaixonei:
Quando me apaixonei
O meu garoto errado
Você pode me achar nas redes sociais, tá? É lá que a gente pode conversar bem muito: