Sobre escrita e música
Tive um casamento muito precoce, ainda na infância me comprometi com a escrita, prometi amar e respeitá-la por todos os dias da minha vida. Porém, na união de um casal nem tudo são flores, diante de adversidades, encontrei uma paixão e me entreguei a ela, me senti envolvida e atraída. Vi-me envolvida por outro, a música.
Da infância à juventude a música esteve a espreita, enquanto minha preferência estava, ainda, entre leitura, escrita e teatro. Os piores momentos que passei na vida eram desabafados num diário improvisado no caderno de capa mole que minha mãe comprava por menos de R$5. Embora, fosse uma boa alternativa para a fuga da realidade, a escrita fazia muito o tipo julgadora. Tornava a sensação de ansiedade mais palpável. Foi então que a música voltou a dar as caras, prometendo alívio imediato e sem possibilidade de julgamentos.
Interessei-me quase que imediatamente.
Passei a ouvir bandas de ritmos dançantes, como “Calypso”, ainda que permaneça como fã do gênero, não foi naquele ato que fui fisgada pela música. Rotineiramente tinha o prazer de ouvir as músicas originais de clássicos de animações da Disney, composições de grandes nomes como Phil Collins, Alan Melek e Celine Dion. Produções como “You’ll Be In My Heart” e “Remember Me” são minhas preferidas, ajudaram a expressar o meu amor, mas só pioraram a situação em que estava vivendo.
As canções são tão lindas que fazem meus olhos encherem de lágrimas pela dor da perda e saudade constante.
Na semana do dia 9 de abril de 2019, quando perdi uma parte de mim que me senti totalmente fisgada pela música. A partir daquela data, parei de fazer tudo que gostava, já não atuava há meses, não escrevia ou sentia vontade, mal comia, passava o dia inteiro assistindo um seriado canadense melodramático e sempre estava deitada num velho sofá vermelho. Passados exatos oito dias, na contagem recifense em que dizemos: “de hoje a oito”, com vontade apenas de chorar.
No último dia, quando percebi que infelizmente a vida não para, coloquei os fones no ouvido e só apertei o start na playlist que já estava aberta. Foi nesse momento que fui atraída, consumida por um sentimento bom pela música. A melódia era acolhedora, suave, meio indie. O álbum era tão poético que quase senti cada verso e letra me abraçando, me fazendo involuntariamente sorrir. Ouvi as músicas no aleatório até chegar em Maya que embora ouvisse desde seu lançamento, só entendi naquele dia.
A música diz:
Repeti Maya mais quatro vezes e resolvi “sair de casa”. Logo, o sentimento foi se intensificando pelo tempo em que o fone ficava no meu ouvido, escutando a melodia, como se fosse o primeiro colo.
A interpretação da música recifense tinha um significado tão amplo na minha mente que me ajudou a esquecer a palavra com “c” que era a principal responsável dos meus pelos se arrepiarem e os olhos ficarem marejados. A partir disso, resolvi sair da casa que eu havia montado aonde todos os móveis eram feitos das lembranças dos cinco dias que antecederam o dia 9 de abril, todas ruins e que estavam fazendo minha inteligência emocional quase deixar de existir.
Por uma razão divina, ou apenas pela aleatoriedade do Spotify, Maya existiu para me atingir com força para arrumar tudo o que a vida bagunçou. A partir desse som, a música virou uma rotina na minha vida. Desde esse dia fui sendo curada, senti as características ruins deixarem de marcar presença a cada minuto do dia.
Repetia sempre “arrume o cabelo/ e o que a vida bagunçou” e ficava cada vez melhor.
Ainda é cedo para determinar a cura, há dias que a saudade aperta, a ansiedade tem feito meus dentes baterem durante a noite, e travarem durante o dia. Contudo, a música que se repete na minha cabeça tá ali dizendo: “tu é forte. Arruma o cabelo.”
Sobre a escrita, ainda é o parceiro ideal. Sobre a música, uma boa amizade, carinhosa, saudosa. As duas, andam juntos, e podem criar mais Mayas.